Extraordinário
é um
livro que enfoca os diversos aspectos do preconceito e do bullying, numa
história edificante que conduz o leitor a refletir sobre os padrões de “beleza” padronizados pela
coletividade, através de August Pullman,
um garoto de 10 anos, que nasceu com uma síndrome genética, que o destaca e
define quase tudo em sua vida, quando tudo o que ele quer é “apenas” ser mais
um na multidão.
O fato é de que as pessoas não conseguem disfarçar a
surpresa quando o veem, assim uns recuam, outros hesitam, enquanto outros até
tentam dar um sorriso solidário ou ensaiam uma fuga disfarçada.
“Médicos vieram de cidades distantes
, só para me ver, parados ao lado da minha cama sem acreditar. Dizem que só
posso ser uma das maravilhas da Criação, e até onde veem não conseguem
explicar.”
Partindo de uma história simples, com frases curtas, muitos
diálogos, tiradas bem-humoradas e personagens cativantes, o livro conta a
história de August, um menino que nasceu com uma séria deformidade facial e,
mesmo tendo passado por uma série de cirurgias, com longos e dolorosos períodos de recuperação,
ainda apresenta sequelas em sua face, fato esse, que contribuiu para que Auggie não frequentasse
nenhuma escola, tanto que sua educação ficou por conta de sua mãe, Isabel,
pelo menos, até os 10 anos.
Como sua saúde se estabilizou, seus pais decidem matriculá-lo
numa escola
e, é claro, que Auggie, inicialmente, não aceita essa ideia,
não só
atormentado pelas dúvidas, como também
pelo medo de como racionaria ao fato de
se tornar o foco das atenções, pelo menos até que se acostumassem à “novidade”
e ele acabasse passando despercebido.
August
acaba concordando, desde que pudesse desistir, se assim o desejasse. Sabe que
tem de enfrentar os medos e os obstáculos comuns a qualquer um que começa numa
nova escola e, além de ter que encontrar
uma forma de ser aceito pelos colegas, tem que provar, acima de tudo, que apesar dessa aparência incomum, ele é
apenas um garoto como qualquer outro. Assim, Auggie vai à escola, faz amigos,
sofre bullying por “ser diferente”, mas por fim descobre que ele, assim como
quaquer outro garoto, possui um lugar só
seu no mundo.
Palacio consegue apresentar um personagem forte, com força
de vontade, visualizando e transformando olhares das pessoas que o rejeitavam,
mostrando que seu problema não é pretexto para não ser considerado como uma
pessoa normal.
“Sei que não sou um garoto normal de
dez anos comum. Quer dizer, é claro que faço coisas comuns. (...) Essas coisas
me fazem ser comum. Por dentro. Mas sei que crianças comuns não fazem outras
crianças comuns saírem correndo e gritando do parquinho. Sei que os outros não
ficam encarando as crianças comuns aonde quer que elas vão.”
Primeiro
lugar da lista de best-sellers do The New York Times, eleito um dos melhores
títulos YA de 2012 nos Estados Unidos, o premiado livro de estreia da americana
R. J. Palacio, consegue captar o impacto que um menino pode causar na vida e no
comportamento da família, dos amigos e da comunidade – um impacto forte,
comovente e, acima de tudo, positivo.
Para
escrever este livro, R.J. Palacio se inspirou numa experiência pessoal, vivida
por ela e seus filhos, quando em uma sorveteria, seu filho caçula, de 3 anos, assustou-se com uma
menina com deformidade facial e começou a chorar e o mais velho ficou
bastante alarmado, obrigando-a a sair do local para não causar maiores
constrangimentos para a família da menina. A autora ficou pensando a respeito da menina, seus pais,
irmãos, amigos, o que a levou a desenvolver o projeto deste livro com o objetivo
de ensinar a seus filhos como se portar e entender situações como estas.
August
— Auggie, para a família e amigos — é
amado e superprotegido pela família e
vive confortavelmente em seu lar, porém, quando toma contato com o mundo
exterior, como um simples passeio a um parque , não consegue passar despercebido
e observa as expressões de repulsa ou compaixão que provoca nos demais.
“Mas sei que as
crianças comuns não fazem outras crianças comuns saírem correndo e gritando do
parquinho. Sei que os outros não ficam encarando as crianças comuns aonde quer
que elas vão.”
O
livro é um exercício constante de “se colocar no lugar do protagonista”
e imaginar como é a vida dele, como é ser diferente, como é ser
constantemente observado e ter que provar que apesar dessa “diferença facial”, ele é
apenas um garoto como qualquer outro e, como pais, como é educar e preparar um
filho para o mundo, que por mais forte que se torne sempre encontrará pelo
caminho desafios muito maiores do que podem imaginar.
"Mamãe e papai
também não me acham comum. Eles me acham extraordinário. Talvez a única pessoa
no mundo que percebe o quanto sou comum seja eu."
Auggie, é um personagem muito real, quase palpável que
injeta no leitor aquela dose de realidade, pois temos conhecimento de que
quando se trata de pessoas com alguma deficiência e/ou problemas genéticos, temos
que assumir que olhamos de maneira diferente, mesmo que seja aquele olhar de
pena.
“Talvez a única pessoa no mundo que percebe no mundo o quanto sou comum seja eu.”
“Talvez a única pessoa no mundo que percebe no mundo o quanto sou comum seja eu.”
Narrado
na 1ª pessoa, a trama traz uma narrativa simples, envolvente e emocionante,
onde a autora consegue construir uma história que atinge a todos os tipos de
leitores. Extraordinário, não se resume a um personagem , no caso
Auggie, mas também se passa aos olhos de outros personagens próximos a ele, como
sua irmã Olívia/Via, o cunhado Justin, o
amigo Jack Will, Miranda e Summer, mostrando
dessa forma, não só como August se sente, mas também, como é visto e sentido
pelos demais personagens, fazendo com que o leitor vá coletando os pedaços da história e ,
instintivamente, crie uma empatia com os personagens.
Vale a pena citar ainda que não é um por cada capítulo, mas
um por cada parte e, cada uma dessas
partes, é separada por uma espécie de
folha de rosto, que contém sempre uma citação refletiva, retirada de uma música
ou de um livro, o que permite ao leitor ver a história por diferentes ângulos.
Um dos relatos mais
verdadeiros e emocionantes é o de Via, sua irmã, que sente obrigação em protegê-lo, amá-lo e sempre
esteve em segundo plano por causa do tratamento do irmão, mas que apesar de se
sentir negligenciada, é transparente no amor genuíno que ela nutre por Anggie e
pelos pais.
“Eu gostaria que todos os dias fossem
Halloween. Poderíamos ficar mascarados o tempo todo. Então andaríamos por aí e
conheceríamos as pessoas antes de saber como elas são sem máscara.”
É
possível que muitos leitores se identifiquem com o texto, seja por ter vivido ou
presenciado algo semelhante. Por outro lado o fato da autora, entre
outros, enfocar o crescimento de Auggie, faz com que o leitor perceba que este
crescimento não só afeta o protagonista, mas também afeta o crescimento dos que
o rodeiam, o que é válido dizer que, muitas vezes, com um simples ato de gentileza pode-se mudar
a vida de alguém, ou ao contrário, com uma simples olhada de lado, pode-se acabar
com a vida de outrem.
O
fato é de que para uns, deformidades, cicatrizes e deficiências, são fraquezas
óbvias conhecidas como anormalidades; para
outros que se auto denominam “normais”,
simplesmente maquiam suas fraquezas e imperfeições, externamente, mas,
internamente, elas estão mais do que vivas, latejando prontas para saltar a
qualquer momento; para aqueles que se mantém alheios e simplesmente desviam o
olhar, enfim, a grande mensagem do livro
é a esperança de que esta trama possa despertar em cada leitor o desejo de
rever suas atitudes e mudá-las, se assim for necessário, para que um dia possa
ser como Auggie — carregar suas deficiências, sem maquiagem e mostrar suas
vulnerabilidades para qualquer um que se interesse em olhar com o coração.
“Agora, esse é meu segredo. É muito
simples. Só pode enxergar direito com o coração. O essencial é invisível aos
olhos.” – Antoine de Sant- Exupéry, O Pequeno Príncipe.
Pode-se dizer que Extraordinário traz, sobretudo, uma
mensagem de amor, amizade, respeito ao próximo, lealdade, aceitação, confiança
e igualdade. O leitor será conduzido a um misto de sentimentos como,
gargalhadas, lágrimas, repulsa por alguns personagens, tristeza, depois alegria e, a cada página virada, sentirá um
amor incondicional por Auggie e o desejo
de abraçá-lo e protege-lo.
Vale dizer ainda que o slogan “não julgue um menino pela cara”, fazendo trocadilho com o tão
conhecido “não julgue um livro pela capa”,
foi muito bem utilizado, o que nos possibilita dizer que muito embora
vivamos num mundo onde a “aparência” é
imprescindível, há em cada um de nós, uma outra beleza em forma de “brilho
único e intransferível”, que ninguém pode ofuscar e que representa a beleza
mais importante de qualquer ser humano, tornando-o, sem dúvida nenhuma, Extraordinário!
Um livro para ser lido com suas crianças e indicado para atoda a família, amigos e,
principalmente, pelos inimigos naturais!
“Para mim, porém, sou apenas eu. Um
garoto comum. Mas, se quiserem me dar uma medalha por ser eu mesmo, tudo bem.
Aceito. Não destrúí a Estrela da Morte nem nada parecido, mas consegui passar
pelo quinto ano. E isso não é fácil, mesmo que você não seja eu.”
Autor: R. J. Palácio
Tradução: Rachel Agavino, 2013
Editora: Intrínsica
Preço: De R$ 17,40 até 24,90
Tags:
Extraordinário, preconceito,
aceitação, bullying, padrões debeleza, garoto, síndrome genética, sequel, deformidade facial,
vida.