É Assim que Acaba — Colleen Hoover

O livro É Assim Que Acaba, escrito por Colleen Hoover, tornou-se um sucesso de vendas ao redor do mundo, ao contar a história de Lily Bloom, que cresceu em um lar abusivo, onde seu pai agredia constantemente sua mãe, deixando sérios traumas na sua vida, o qual a levou sempre a questionar sobre os motivos da mãe continuar no relacionamento.

Em busca de renovar sua vida, seguindo seus sonhos, muda para Boston para abrir seu próprio negócio. Lily então conhece o neurocirurgião Ryle e ela se apaixona por ele. Porém, Atlas Corrigan, seu primeiro amor,  que ela deixou para trás na época do colégio, reaparece e tudo o que Lily construiu com Ryle pode ruir.

O romance é inspirado na vida da mãe da autora e aborda temáticas delicadas como relacionamento abusivo e violência doméstica, além de outros temas como amor, perda, superação e autodescobrimento. É a obra mais pessoal de Colleen Hoover, o qual aborda sem medo alguns tabus da sociedade para explorar a complexidade das relações tóxicas, e como o amor e o abuso muitas vezes coexistem em uma confusão de sentimentos, o qual impedem aquele que sofre de se soltar das amarras dos sentimentos, retratando de maneira poderosa a devastação que o abuso pode causar e a força de quem sobrevive a ele. Trata-se de uma narrativa sobre a força necessária para fazer as escolhas certas nas situações mais difíceis.

Hoover é atualmente a romancista mais vendida nos EUA, escrevendo cinco dos 10 livros mais vendidos de qualquer gênero em 2022, com mais de 20 milhões de cópias vendidas. É Assim Que Acaba encerrou 2022 como o livro impresso mais vendido e está na lista dos mais vendidos do The New York Times e, também, se tornou um fenômeno no BookTok ao longo dos últimos anos. O livro será adaptado para as telonas, com Blake Lively, que interpretará a protagonista Lily, Justin Baldoni viverá Ryle e o ator Brandon Sklenar será o responsável por dar vida ao personagem Atlas.

É assim que acaba relata os relacionamentos abusivos, a partir das memórias de Lily Bloom, uma jovem de 23 anos apaixonada por jardinagem e do comportamento agressivo do seu pai para com sua mãe.  Lily presenciou desde muito jovem, a mãe sendo espancada pelo pai (prefeito da cidade) sem nunca revidar ou fazer qualquer coisa para ir embora. A jovem, que reprimiu a raiva que sentia do pai por anos, por assistir ele bater em sua mãe por motivos banais.

A partir do momento em que Lily passa a intervir nos conflitos, ela acaba sofrendo dessa mesma violência, além da violência psicológica e emocional, uma vez que era privada de ter amizades pois as pessoas da cidade não poderiam saber como era o prefeito em casa.

O livro começa com Lily citando o que ela tanto presenciou em casa e como isso refletiu sobre seus relacionamentos futuros, incluindo seu julgamento sobre sua mãe. Durante a leitura é impossível o leitor não se colocar no lugar da personagem achando que teria caído fora se estivesse no seu lugar. Mas, porém, todavia, contudo, a realidade é dura e muito diferente, já que se torna difícil ver os defeitos da pessoa e ver o quanto a pessoa está te fazendo mal, principalmente quando esse alguém é amado de verdade.

Conforme Lily cresce, passa a questionar as justificativas da mãe para se manter nesse relacionamento tão tóxico e violento, e só passa a entender as atitudes da mãe quando passa pela mesma situação.

Um ponto interessante da história é o leitor ter conhecimento do passado de Lily,  através da leitura das cartas que a protagonista escreveu durante a adolescência para a comediante Ellen DeGeneres. Como Lily era impedida de ter amigos, seu único refúgio eram os programas de televisão da apresentadora Ellen DeGeneres e a amizade que desenvolveu com Atlas Corrigan, que vivia do outro lado da rua de sua casa. Assistir aos programas da Ellen, torna-se um hábito e ela acaba elegendo Ellen como sua amiga, escrevendo sobre o que acontecia com ela, descrevendo sobre o pai, sobre a situação de Atlas, um rapaz que mudou a vida de Lily no passado, o que desperta a curiosidade no leitor em saber quem era Atlas e o que aconteceu entre eles.

“Imagine todas as pessoas que você conhece ao longo de sua vida. São muitas. Elas surgem como ondas, entrando e saindo aos poucos, dependendo da maré. Algumas ondas são muito maiores e causam mais impacto que outras. Às vezes, as ondas trazem coisas lá do fundo do mar e as largam no litoral. Marcas nos grãos de areia que provam que as ondas estiveram lá, muito depois de a maré recuar.”

Aos 16 anos Lily conhece Atlas que tinha 18, um jovem abandonado pelos pais que se viu forçado a morar nas ruas muito cedo, e passa a ocupar a casa abandonada vizinha de Lily. Eles frequentam a mesma escola e Lily passa a notar o garoto, inclusive o ajudando com alimentos e acabam se tornando amigos. 

Ele e Lily tem uma conexão imediata na época em que se conhecem, talvez pelo fato de um precisar muito de alguém como o outro em sua vida. Atlas conhecendo a realidade da família de Lily, reconhece nela as mesmas mazelas de quem cresce em um lar violento. Essa proximidade e identificação acaba por resultar no primeiro amor de Lily e deixar marcas ainda mais profundas.

Quando parte para Boston, Lily, já longe dos pais e sem contato com Atlas, desenvolve a ambição de abrir a própria floricultura. E é em uma noite conflituosa de sua vida que conhece Ryle Kincaid e acaba se sentindo atraída pelo mesmo.

Ryle Kincaid é um futuro neurocirurgião extremamente talentoso, lindo, rico e atormentado por um fantasma do passado que o leitor só descobrirá na segunda metade do livro. Ao longo do livro, ele acaba se mostrando o total oposto de Atlas Corrigan, primeiro amor e amigo de Lily.

Lily o conhece em um desses momentos de tormento no telhado de um prédio em Boston. E lá começa a mania do casal de trocar “verdades nuas e cruas”; momentos ocasionais em que um confessa para o outro algo que esteja pensando e/ou sentindo sem parar para pensar ou enrolar.

A partir do momento em que Lily e Ryle começam a se relacionar ele se mostra um cara legal, com todas as qualidades que ela procura. O leitor conhece um lado machucado de Ryle, pois ele acabou de perder um paciente em cirurgia, no mesmo momento em que Lily acabou de sair do funeral de seu pai e ambos encontram-se frágeis, o que faz com que se afastam mas, por acaso, voltam a se encontrar e é quando iniciam o relacionamento, mesmo Lily sabendo que Ryle tem uma grande aversão por relacionamentos. Tudo parecia perfeito e após alguns meses, eles acabam se casando.

Conforme a relação de Lily e Ryle evolui, algumas coisas que Lily jurou nunca admitir na sua vida começam a acontecer com ela. Ryle, que aparentava ser perfeito, acaba mostrando ser o maior pesadelo de Lily. Ele tem episódios de violência como seu pai. No momento da primeira agressão de Ryle, Lily já percebe que está em um relacionamento abusivo.

A forma com que Ryle é construído faz com que, inicialmente, o leitor torça pelo relacionamento com Lily, afinal todo mundo tem problemas. Porém, Lily se vê no meio de um relacionamento turbulento que não é o que ela esperava e, infelizmente, percebe que está vivendo um relacionamento abusivo, no qual o leitor perceberá o quanto “não é fácil sair".

A autora consegue retratar essa história com uma cruel realidade que assombra muitas mulheres. O primeiro fato é que em todas as cenas de violência e agressão Ryle estava bêbado, claro que o álcool e outros entorpecentes pioraram muito esses atos, mas a impressão, no caso de Ryle, a bebida era a justificativa para as suas ações.

A partir do primeiro momento de agressão muitos leitores começam a ser contra esse relacionamento, já que diferente da mãe, Lily tinha seu próprio negócio, não dependia financeiramente do marido e poderia sair desse relacionamento, mas estava apaixonada, e decide continuar com Ryle, acreditando que ele está mudando, mas no fundo ele era e continuava sendo a mesma pessoa.

Lily fala muito sobre os votos de casamento dela, sobre amar na alegria e na tristeza, entretanto a promessa já foi rompida no primeiro segundo de agressão, seja por qual for a razão. Então, não deveria haver culpas por deixar o casamento/relacionamento e priorizar sua vida, sua dignidade e sua família, porque ou você acaba ou ele vai acabar com você.

 “Todo incidente abala um pouco seu limite. Toda vez que você decide ficar, torna muito mais difícil abandoná-lo da próxima vez.”

Infelizmente esta é a realidade. O fato é que o romance leva o leitor a experimentar um mix de sentimentos, desde a sensação de alegria nas primeiras páginas a uma tristeza no decorrer da história e, consequentemente, conduz o leitor a avaliar seu relacionamento, seu companheiro, os sentimentos bons e ruins, a imposição de limites e começa a se questionar o quanto é prejudicial deixar a emoção falar mais alto que a razão.

As agressões e a tentativa de estupro mostram como o amor pode ser tão possessivo que chega a machucar quem mais amamos e que, muitas vezes,  pode ser visto de fora de uma maneira totalmente diferente, assim como a Lily pensava que sua mãe era fraca por não deixar o marido.

Vivendo com essa situação e à medida que se questiona sobre sua vida, somado ao reencontro com Atlas, Lily passa a questionar de fato seu relacionamento com Ryle. Suas feridas afloram e as fazem reviver as dores do relacionamento de seus pais e sente que tudo o que construiu com Ryle está ameaçado.

Altas é um personagem apresentado nos flashbacks da vida de Lily, ele é o passado que ela nunca esqueceu. No momento em que Atlas reaparece em sua vida, seu coração bate mais forte, mas ela está vivendo uma nova fase. Entretanto, quando as agressões continuam ela foge para casa dele, e eles percebem que o sentimento deles não mudou.

Na verdade, Lily ao conseguir largar esse homem e sair do relacionamento abusivo, reconhece o quanto a mãe dela foi muito forte e aguentou o pai dela pra muita das vezes proteger sua filha, o que  leva o leitor  a torcer para que ela não volte com o Ryle por causa de sua filhinha. 

O leitor amará a força de Lily no decorrer do livro e ficará atento aos detalhes dos acontecimentos e de seus pensamentos, da postura, das crenças, das decisões, das indecisões e suas falhas que conduzirão o leitor a perceber que existem muitas Lily's ao seu redor e, quem sabe, até mesmo, dentro dele. 

Á primeira vista, é difícil entender o que leva uma pessoa que sofre agressões físicas, psicológicas e morais dentro de casa a continuar dentro de casa e, muitas vezes, é fácil simplesmente apontar o dedo para alguém que passa por esse tipo de situação e dizer o que eles deveriam fazer. 

O fato é que este romance consegue desconstruir esse padrão, já que permite que o leitor vivencie a experiência do outro lado da moeda, proporcionando-lhe uma mescla de emoções, como: rir, chorar, alegria, raiva, sensação de impotência e a cada página, certamente, transportar-se-á para o lugar de Lily. 

Pode-se dizer que a leitura de É assim que acaba é recomendada não só para quem está passando, ou já passou, ou para quem ainda não despertou, mesmo diante de algumas situações semelhantes. Com certeza é uma daquelas leituras que realmente podem fazer a diferença na vida de quem quer que seja. Mas, enxugue as lágrimas, felizmente, o livro termina abrindo uma esperança para a felicidade de Lily X Atlas. Então, bora ler “É Assim que Começa”? 

 

É Assim que Acaba — Colleen Hoover 

Título Original: It Starts With Us

Tradutor: Priscila Catão

Editora: Galera Record

Edição/preço: Kindle — A partir de R$ 34,11 

                       Capa Comum — A partir de R$ 33,78

 

Tags: Violência doméstica, relacionamento tóxico, comportamento agressivo, mãe, pai, neurocirurgião, restaurante